O PUTO VESTE BRANCO
(1996, dir. Bruce LaBruce, Rick Castro)
Entre novembro e dezembro de 2024, estive em São Paulo e tive a sorte de visitar o MIS (Museu da Imagem e Som) durante uma exposição acerca da obra de Bruce Labruce. Na entrada da mostra, gratuita, um protocolo rígido. Estava com um amigo e ambos precisamos selar nossos celulares em sacos específicos. O procedimento fazia sentido dado o histórico de censura e violência que instituições e projetos voltados para o sexo e o erótico sofreram na última década (a lembrar do fatídico epsódio do Queer Museu).
Esse amigo que comigo estava é antigo. Nos conhecemos ainda no interior do Rio Grande do Sul, quando ele era uma das minhas primeiras paixões de adolescência. Estava a passeio em São Paulo e fui seu hóspede. Ele estava próximo de concluir o curso Audiovisual na USP (Universidade de São Paulo).
Foi através dele que ouvi sobre Bruce Labruce pela primeira vez, ainda no ensino médio. Estávamos na casa de uma amiga quando ele sugeriu que assistíssemos o Reich Framboesa (The Raspberry Reich). Citou uma frase do filme: "No revolution without sexual revolution. No sexual revolution without homosexual revolution." (Não existe revolução sem revolução sexual. Não existe revolução sexual sem uma revolução homossexual). Acabamos não assistindo filme algum naquela noite e eventualmente eu esqueci da sugestão.
O que aconteceu no MIS foi um reencontro, com Arthur e com Bruce. Foi na exposição, vendo o histórico do diretor, que me dei conta. Era aquele o filme que eu tinha esquecido, de onde vinha aquela frase que de alguma forma eu lembrava. Quando o Cineclube Vestígio definiu a curadoria da primeira mostra semestral de 2025, eu estava certo de que algum filme do Bruce Labruce precisaria estar incluso. A exposição do MIS, que proibia a entrada de celulares, era justamente sobre a transgressão e presença de sexo e sexualidade debatidos nos filmes.
Ainda em São Paulo, pedi uma recomendação para Arthur. Deveria assistir o Reich Framboesa, que foi por ele sugerido no Ensino Médio? Passados alguns anos, ele tinha uma sugestão melhor. Voltamos ao início da exposição, onde ele apontou para o trecho que falava de Hustler White, que o Cineclube Vestígio acabou traduzindo como O Puto Veste Branco.
Arthur disse que eu ia gostar. Que de todos, provavelmente era o que mais tinha a ver comigo. Que não era tão explicitamente sexual, que tinha uma carga documental. Que um dos protagonistas tinha envolvimento com a Madonna. No caso, Tony Ward, que interpreta o Monti no filme.
E é por Monti que Jürgen se apaixona. Enquanto este é uma maricona da universidade, aquele é um garoto de programa, forte, de nariz grande e trejeitos masculinos. A busca de um e a fuga de outro é o fio condutor do filme, que atravessa os mais variados episódios da sexualidade masculina na cidade da costa oeste dos EUA.
Nenhum desses homens parece objeto. Eles têm seus desejos, emoções, dificuldades. Estão vendendo o sexo por variados motivos. Eles também têm limites. O próprio Monti compartilha intimidades em uma entrevista que aparece no filme vez ou outra. Antes de sentir tesão, sentimos uma conexão e intimidade imediata pelas personagens. Rimos, choramos, gozamos. É um filme sensível e que trata com respeito seu assunto.
Jürgen não transa durante o filme, mas acompanha, fascinado, a sexualidade daqueles que trabalham com o sexo na cidade. Jürgen não poupa comentários, é objetivo, incisivo, tem um humor gay. Tem uma persona que em partes é desmontada por Monti. Um amor idealizado que vira matéria. Não acho que o filme seja uma história de amor, mas o amor faz parte desse jogo de encontros e desencontros que é a vida. Assim como com as dores, cada qual encontra uma forma de lidar com isso.
Arthur estava certo. Eu realmente gostei do filme.